Mila Ramos
Por FERREIRA GULLAR
“O julgamento do STF
realiza-se à vista de milhões de telespectadores. Não é uma
conspiração”
GOSTARIA DE deixar
claro que não tenho nada de pessoal contra o ex-presidente Lula, nem nenhum
compromisso partidário, eleitoral ou ideológico com ninguém. Digo isso porque,
nesta coluna, tenho emitido, com alguma frequência, opiniões críticas sobre a
atuação do referido político, o que poderia levar o leitor àquela
suposição.
Não resta dúvida de
que tenho sérias restrições ao seu comportamento e especificamente a certas
declarações que emite, sem qualquer compromisso com a
verdade dos fatos. E, se o faço, é porque o tenho como um líder
político importante, capaz de influir no destino do país. Noutras palavras, o
que ele diz e faz, pela influência de que desfruta, importa a todos
nós.
E a propósito disso
é que me surpreende a facilidade com que faz afirmações que só atendem a sua
conveniência, mas sem qualquer compromisso com a verdade. É certo que o faz sabendo que não
enganará as pessoas bem informadas, mas sim aquelas que creem cegamente no que
ele diga, seja o que for.
Exemplo disso foi a
entrevista que deu a um repórter do “New York Times”, quando voltou a afirmar que o mensalão é
apenas uma invenção de seus adversários políticos. E vejam bem,
ele fez tal afirmação quando o Supremo Tribunal Federal já julgava os acusados
nesse processo e já havia condenado vários deles. Afirmar o que afirmou em tais
circunstâncias mostra o seu total descompromisso com a verdade e total
desrespeito com às instituições do Estado
brasileiro.
Pode alguém admitir
que a mais alta corte de Justiça do país aceitaria, como procedentes, acusações
que fossem meras invenções de políticos e jornalistas
irresponsáveis?
E mais: os ministros
do STF passaram sete anos analisando os autos desse processo, tempo mais que
suficiente para avaliá-lo. Afirmar, como faz Lula, que tudo aquilo é mera
invenção equivale a dizer, implicitamente, que os ministros do STF são
coniventes com uma grande farsa.
Mas o descompromisso
de Lula com os fatos parece não ter limites. Para levar o
entrevistador do “NYT” a crer na sua versão, disse que não precisava comprar
votos, pois, ao assumir a Presidência, contava com a maioria dos deputados
federais.
Não contava. Os
verdadeiros dados são os seguintes: o PT elegera 91 deputados; o PSB, 24,; o PL,
26, o PC do B, 12, num total de 153 deputados. Mesmo com os eleitos por partidos
menores, cuja adesão negociava, não alcançava a metade mais um dos membros da
Câmara Federal.
Cabe observar que
ele não disse ao jornalista norte-americano que não comprou os deputados porque
seria indigno fazê-lo. Disse que não os comprou porque tinha maioria, ou seja,
não necessitava comprá-los. Pode-se deduzir,
então, que, como na verdade necessitava, os comprou. Não há que se surpreender,
Lula é isso mesmo.
Sempre o foi, desde sua militância no sindicato. Para ele, não há valores: vale
o que o levar ao poder ou o mantiver
nele.
Sucede que, apesar
do que diga, ninguém mais duvida de que houve o mensalão. Pior ainda, corre por
aí que o Marcos Valério
está disposto a pôr a boca no mundo e contar que o verdadeiro chefe da patranha
era o Lula mesmo, como, aliás, sempre esteve evidente. E já o
procurador-geral da República declarou que, se os dados se confirmarem, o
processará. É nessas horas que o Lula falastrão se cala e desaparece. Às vezes,
chama Dilma para defendê-lo.
Desta vez, chamou o
Rui Falcão, presidente do PT, para articular o apoio dos líderes da base
política do governo. Disso resultou um documento desastroso, que chega ao ponto
de acusar o Supremo de perpetrar um golpe de Estado contra a democracia,
equivalente aos golpes que derrubaram Vargas e João Goulart. Pode? Vargas e
Goulart, como se sabe, foram depostos pela extrema direita com o apoio de
militares golpistas.
O julgamento do STF
realiza-se às claras, à vista de milhões de telespectadores. Não é uma
conspiração. Ele desempenha as
funções que a Constituição lhe atribui. E que golpe é esse contra um político
que não está no poder?
O tal manifesto só
causou constrangimento. O governador Eduardo Campos, de Pernambuco, deu a
entender que foi forçado a assiná-lo, após rejeitar três versões dele. Enfim,
mais um vexame. Só que
Lula, nessas horas, não aparece. Manda alguém fazer por ele, seja um manifesto,
seja um mensalão.
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