Eu faço 80 anos hoje.
Na verdade, não percebi
diferença nenhuma de ontem, com 79, para hoje. As diferenças veem de longe.
Veem do tempo em que eu
gostava sair – e tinha companhia para isso.
Veem do tempo em que, para
ver um bom filme, eu precisava sair de casa.
Veem de quando eu gostava
de comprar roupa nova, de fazer dieta e emagrecer, de arrumar o cabelo, de usar
salto alto...
As diferenças veem
chegando aos poucos e a gente nem se dá conta. Salvam-nos os filhos e os presentes que eles nos dão: netos! Bisneto -já vem chegando o primeiro aí...
O primeiro choque vem com
a aposentadoria, mas doeu pouco porque logo fui chamada por pessoas que
confiavam em mim aos 60 anos, para um árduo trabalho cultural. Consegui
realizá-lo.
Depois parei de jogar,
segundas animadas com a Vada, a Mariza, a Hilda - depois a Yara.
Depois, assumi com prazer
e orgulho, uma página semanal em a Notícias do Dia e fiz leitores a mil. Quando
cansei, pedi pra sair, deixando, segundo a Direção do Jornal, as portas abertas
para meus pensares. Às vezes, volto lá.
Depois disso, comecei a
não sair de casa. E ainda pago para ficar aqui.
Sou dona da minha vida,
não sei até quando. Cuido da minha saúde, vou aos médicos sozinha, ao banco, ao
supermercado, à livraria. E só. À Igreja, quando posso ir à tarde, pois que
minha Igreja de Nossa Senhora de Fátima e de Santo Antônio, às vezes, celebram
Missa à tarde.
Aos domingos, minha fé
fica ao encargo do Divino Pai Eterno e Ele vem aqui em casa.
Não vou mais a festas. Nem
a enterros.
Não acho graça em nenhum
dos dois.
Gosto que venham à minha
casa as pessoas que gostam de mim.
Minha casa me sustem, meu
jardim me encanta, meu escritório é meu amparo. Ele preenche-me de quase tudo o
que ainda necessito : zelar pela minha memória que é muito boa, graças a
Deus. Não digo ótima porque, de repente, falta-me o nome de alguém ou de algo,
uma palavra que tem o significado exato para o que quero dizer ou escrever. Aí,
salvai-me Santo Aurélio.
Minha leitura sempre me
sustentou e hoje é meu passatempo maior. Vivo alimentada por excelentes
autores, alguns atuais, outros mais antigos, mas todos muito, muito bons.
E o computador preenche-me
todo o espaço livre ( benditos GBs) e leva-me para perto de quem está longe,
mas vive no meu coração.
E envelhecer foi um
processo impercebível e indolor para mim, graças a Deus.