quinta-feira, 25 de outubro de 2012

A MÃE LÁ DE CASA

 


Mãe lá de casa

Eu estive fora um tempo.
Onde casei, tive filhos e após a separação fui ver como que era a vida de homem recém-separado morando sozinho por alguns meses. Voltei após quase doze anos pra casa de minha mãe para fazer companhia mesmo e não deixá-la tão só. Já não sei quem ganhou mais com essa decisão.
Tenho quase certeza que o maior beneficiado tem sido eu.
Quem me segue no twitter e perde um pouco do seu tempo lendo o que me disponho a postar nos cento e quarenta caracteres por vez já deve ter percebido que sou um tanto deslumbrado com a forma como minha mãe quase octogenária (fará 80 anos daqui a dois meses) enxerga a vida. São dela alguns comentários bem humorados e irônicos, que, volta e meia compartilho com quem me segue naquela rede social.
Tem sido outro prazer que eu não conhecia tão bem assistir a jogos com essa corintiana fanática conhecedora das mais difíceis regras do jogo bretão. Impedimento por exemplo ela tira de letra, muitas vezes, antecipando-se até mesmo aos comentaristas. Dia desses num lance marcado contra o timão antes mesmo de o Arnaldo dar seu veredito, vendo no replay, dona Maria disse com sua habitual ranzinzisse “só tá o Jorge Henrique e o goleiro, então só pode ser a merda do impedimento!”.
São maravilhosas as suas frases feitas e desfeitas: para uma pessoa de difícil índole, “pau torto se você tenta endireitar, quebra...”; dando um conselho sobre um relacionamento, “se você adoça muito a pessoa ela acaba salgando sua vida...”; ou falando sobre o tempo, “o céu escuro já não mostra que vai chover, serve é pra enganar a moça da tevê...”. Sempre séria e com um meio-sorriso a Maria Raposo tem uma frase definitiva pra qualquer coisa, frases que muitas vezes a gente demora pra assimilar.
Ela nunca foi à escola e ultimamente reparamos nela uma preocupação com o falar. Ela se esmera em falar corretamente, o que como minha filha afirma a torna uma fofa. Mas para ela existe uma dificuldade a mais já que ela possui a língua presa e por isso algumas palavras são para ela impronunciáveis. “Pênalti”, por exemplo, vira aquele termo que designa uma parte íntima masculina... Ela tenta falar o nome da loja de materiais para construção onde tem conta e sai um “escorpel” que soa muito mais difícil do que o nome original. Motivos para risadas e no caso do meu filho, gargalhadas. Fazê-la falar certas palavras são para meus dois filhos motivo de festa. Coisas que ela poderia considerar chacota e poderia até ser, mas não, ela sabe que essa característica a torna uma vó diferente, divertida, única. E vó é mãe duas vezes. Sinto que seus netos e bisnetos a renovam e fazem com que ela tenha mais disposição para continuar encarando a vida com alto astral e continuar fazendo com prazer um café novo e fresquinho a cada visita, a cada “passada” de um dos filhos, dos parentes, amigos dos filhos e comadres.
Minha mãe é hoje uma referência para que eu perceba em mim mesmo as falhas que eu não quero para o meu futuro.
Espelho-me nela para continuar a ter prazer nas pequenas coisas como quando dia desses, ela me disse da felicidade que tem ao simplesmente olhar a casa cheia de gente e poder pensar que simplesmente que se todos aqueles estão ali é por causa dela.
Sim, esse pensamento é o que pode nos fazer bem sempre: vou fazer o que for possível para que no futuro eu possa me orgulhar da minha prole.
A mãe lá de casa disse que não quer essa “frescura” de presente de dia das mães. Ela diz que esse negócio foi inventado para que todo mundo “limpe a consciência”. Eu quase entendi o que ela quis dizer, mas nem vou comentar... Domingo a gente vai fazer um almoço especial lá em casa, depois compro um presente como quem não quer nada...

Marco Antônio
Filho da dona Maria do Zé Florentino
Um destaque meu para um bom texto de um  bom filho.
Mila Ramos
 

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