Donald Malschitzky
Meu amigo cronista do Jornal Notícias do Dia, de Joinville-SC fez de sua crônica, uma poesia belíssima. Parabéns.Meu amigo cronista do Jornal Notícias do Dia, de Joinville-SC fez de sua crônica, uma poesia
Mila Ramos
Muito bonita desde
pequena. Imensos olhos azuis cintilantes
e inteligentes muito antes da idade de
serem assim. Nasceu filha única e filha única cresceu.
Por
ser linda, por ser única, por ser filha de pessoas abastadas, foi mimada, muito
mimada, o que incluía cuidados extremos com cada passo. Não que não se sujasse,
mas cedo aprendeu que era feio, que havia milhões de bichinhos na sujeira
(milhões ela não sabia o que era, mas, pela forma com que a palavra era pronunciada, adivinhava que era uma coisa
terrível); correr também não podia, pois poderia bater nos cantos dos móveis.
Pular
corda não sabia, e nunca deixaram que tentasse. Nunca lambuzou o rosto com
caldo de feijão, nem brincou de fazer bolo com bolacha molhada ou qualquer
dessas gororobas que criança chama de comida gostosa.
Amigos
não tinha, pois poderiam passar maus
modos ou, pior, doenças. Seus brinquedos
eram cuidadosamente escolhidos para que não houvesse o mínimo risco de
se cortar, bater, de engolir uma peça. E eram constantemente esterilizados.
Passava
a maior parte do tempo dentro de casa, afinal, o mundo lá fora era tão
perigoso! Havia sempre uma leve névoa de
tristeza nos imensos olhos.
Numa
de suas poucas saídas para o jardim, topou com uma lagarta numa folha.
Assustou-se, como seria de esperar; melhor: apavorou-se e saiu correndo.
Passou
o tempo. Parado para a menininha, de
intensa atividade para a lagarta que construía seu casulo. Dentro da casa,
alguma coisa começou a mexer na cabeça da menininha e, talvez por instinto, talvez
porque houvesse um chamado maior, passou a ficar à janela por longos períodos.
Dentro do casulo, a transformação total e apertada.
Era
um dia de sol e algo causava uma pequena revolução dentro do casulo. Seu
conteúdo aumentava e havia um chamado incontrolável para sair. Devagar, com
muito esforço, um pedaço de asa, outro, do corpo e, em breve, dois leques azuis
se mexiam onde antes havia um casulo cinza. Alguma horas e o impulso
incontrolável de voar. E voou.
A
menina, na janela, encantou-se e acompanhou o vôo da borboleta. Azul como seus
olhos. Em algum lugar alguém se perguntou quem refletia o quê.
Não
tirou os olhos da borboleta, que voou, voou, até se confundir com o céu. E a
menininha ali, com seus olhos fulgurantes. Ela ainda não sabia, mas naquele
momento começara a germinar a semente da liberdade em sua pequenina alma.
Nenhum comentário:
Postar um comentário