terça-feira, 15 de outubro de 2013

AZUL


Donald Malschitzky

Meu amigo cronista do Jornal Notícias do Dia, de Joinville-SC fez de sua crônica, uma poesia belíssima. Parabéns.Meu amigo cronista do Jornal Notícias do Dia, de Joinville-SC fez de sua crônica, uma poesia

Mila Ramos

IMAGEM COLHIDAS NO GOOGLE
 

         Muito bonita desde pequena.  Imensos olhos azuis cintilantes e inteligentes  muito antes da idade de serem assim. Nasceu filha única e filha única cresceu.

Por ser linda, por ser única, por ser filha de pessoas abastadas, foi mimada, muito mimada, o que incluía cuidados extremos com cada passo. Não que não se sujasse, mas cedo aprendeu que era feio, que havia milhões de bichinhos na sujeira (milhões ela não sabia o que era, mas, pela forma com que a palavra  era pronunciada, adivinhava que era uma coisa terrível); correr também não podia, pois poderia bater nos cantos dos móveis.

Pular corda não sabia, e nunca deixaram que tentasse. Nunca lambuzou o rosto com caldo de feijão, nem brincou de fazer bolo com bolacha molhada ou qualquer dessas gororobas que criança chama de comida gostosa.

Amigos não tinha, pois poderiam  passar maus modos ou, pior, doenças. Seus brinquedos  eram cuidadosamente escolhidos para que não houvesse o mínimo risco de se cortar, bater, de engolir uma peça. E eram constantemente esterilizados.

Passava a maior parte do tempo dentro de casa, afinal, o mundo lá fora era tão perigoso! Havia sempre  uma leve névoa de tristeza nos imensos olhos.

Numa de suas poucas saídas para o jardim, topou com uma lagarta numa folha. Assustou-se, como seria de esperar; melhor: apavorou-se e saiu correndo.

Passou  o tempo. Parado para a menininha, de intensa atividade para a lagarta que construía seu casulo. Dentro da casa, alguma coisa começou a mexer na cabeça da menininha e, talvez por instinto, talvez porque houvesse um chamado maior, passou a ficar à janela por longos períodos. Dentro do casulo, a transformação total e apertada.

Era um dia de sol e algo causava uma pequena revolução dentro do casulo. Seu conteúdo aumentava e havia um chamado incontrolável para sair. Devagar, com muito esforço, um pedaço de asa, outro, do corpo e, em breve, dois leques azuis se mexiam onde antes havia um casulo cinza. Alguma horas e o impulso incontrolável de voar. E voou.

A menina, na janela, encantou-se e acompanhou o vôo da borboleta. Azul como seus olhos. Em algum lugar alguém se perguntou quem refletia o quê.

Não tirou os olhos da borboleta, que voou, voou, até se confundir com o céu. E a menininha ali, com seus olhos fulgurantes. Ela ainda não sabia, mas naquele momento começara a germinar a semente da liberdade em sua pequenina alma.

        

 

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