terça-feira, 22 de outubro de 2013

DIA DE FINADOS


 
                                                                                                    
                                               Mila Ramos


 Dia de lavar túmulos, arrancar os matinhos que cresceram dentro ou fora do sepultura sagrada para cada um, comprar flores frescas para homenagear  nossos mortos, rezar.

Tudo igual todos os anos.

Nem tudo tão igual!

Uma coisa deixou de ser igual  para quem visita o cemitério no dia 2 de novembro de todos os anos: as flores.

Houve um tempo em que a gente plantava lírios brancos em maio para que estivessem floridos em novembro.

As baixadas dos terrenos, no nosso jardim, a parte mais úmida, era o lugar em que os copos de leite abriam viçosos esperando as colheitas do dia dos mortos.

As roseiras brancas, aquelas de pencas, esperavam o corte para os vasos menores  dos túmulos,  à espera dos enfeites cheios de vida.

Havia bambu de salão, uma trepadeira verde que nunca florescia, mas dava um toque de amplidão nos vasos imensos, e ele também estava ali.

Muita gente que não tinha como cultivar as flores brancas em seus canteiros ,  zelava  pelas flores que tinha, fossem lá da cor que fossem, mas eram guardadas para o cemitério no dia de seus mortos: eram hibiscos, rosinhas cor-de-rosa, azaléias,cravos, amor-perfeito, violetas, margaridas, onze-horas ou qualquer outra florzinha que vicejasse naquela época.

Mas haveria flor, qualquer que fosse, e o cemitério revivia  em cor, perfume, gente.

Havia velas queimando cercadas por pequenas barreiras improvisadas para que o vento não apagasse a luz que queríamos ver iluminando as almas de nossas saudades.

Hoje, não mais.

Hoje, a gente passa numa loja de flores, compra um vaso feito aos milhares e espalhados pelo Brasil todo, em grandes caminhões.  Quem plantou , não interessa. Interessa que a gente compra e leva para nossos mortos.

Isso, quando é flor plantada em semente e que desabrochava perto do mês de novembro, e não aquela fabricada na China, feita de plástico de má qualidade e pintada de cor berrante e de forma estranha, que não nos lembra flor nenhuma.

 Aos milhares.

Nossos cemitérios ficam  infestados de cores estranhas como num festival  de mau gosto.

É.

Porque agora, não podemos deixar vasos com água no cemitério.

Dá mosquito, dá epidemia de febres e doenças que a gente nem conhece e que também vêm de longe, como as flores de plástico que compramos para ornar nossos mortos.

Antigamente, não  dava mosquito nem febre.

Agora dá.

Pioramos nós ou o mundo em que vivemos?                                            



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